Prémio Fernando távora 2012/13

TÍTULO E SINOPSE:

Dine de pedra a cal

O objectivo de investigação desta viagem à aldeia de Dine situada no Parque Natural do Montesinho é o de produzir cal hidráulica utilizando um processo de cozedura natural. Este material usado na construção será matéria experimental da composição de um tijolo de terra crua compactada que actualmente é composto por 4% de cimento. Pretende-se assim substituir o cimento por esta cal hidráulica para obter um  material de construção 100% natural na sua composição.

Este caminho de aprendizagem a percorrer, usando o contributo do Prémio Fernando Távora, ajudará à participação em uma workshop de  construção em terra a realizar no verão de 2013 e à organização de uma exposição na Galeria Alvarez, em Setembro. A actividade final deste caminho será em Dine, transportando para lá uma unidade móvel de produção de terra crua compactada, utilizando a cal e a terra locais. Também assim deixar lá um agradecimento pela ajuda e entusiasmo que sentimos desde já.

As entidades e pessoas mencionadas nesta candidatura formam uma equipa que mantém viva a construção em terra.

ROTEIRO / PLANO DE VIAGEM

Fevereiro a Junho 2013 – Produção de cal hidráulica natural em Dine.

Nesta experimentação pretende-se reactivar o forno mais pequeno do conjunto. A Sra. Judite Lopes e seu marido Sr. Telmo Aires acolheram com entusiasmo a reactivação do forno onde se produzia a cal para as obras pretendiam efectuar em casa. Em Novembro de 2012 foi analisada a localização e dureza da pedra calcária e com o Sr. Telmo Aires, que trabalhou na recolha de urze, fomos com o enxadão arrancar as suas raízes. Nas conversas que foram surgindo pressente-se a memória do tempo em que se produzia cal em Dine permanece viva. Sentimos desde já que a ideia é acolhida como uma boa notícia e desperta histórias de outros tempos.

Entre 9 e 12 de Fevereiro e entre 25 e 28 de Abril estão previstos os trabalhos preparatórios de extracção e britagem da pedra e a recolha e  preparação da raiz de urze.

Entre 30 de Maio e 2 de Junho de 2013 está previsto o enchimento do forno e produção de cal.

A partir de Junho 2013 – Produção e análise de tijolos em terra crua compactada usando cal hidráulica
natural.

Da cal hidráulica obtida serão produzidos tijolos para serem submetidos a ensaios laboratoriais à
semelhança dos testes realizados utilizando cimento. Contamos já com a disponibilidade e interesse da Arq.
Rute Eires e Professor Saíd Jalali do Departamento de Engenharia Civil do Pólo de Guimarães da
Universidade do Minho.

Julho e Agosto 2013 – Workshop centoecatorze

Em colaboração com os Ceramistas Marisa Alves e Joaquim Pombal está prevista a realização de um workshop sobre construção em terra com calendarização a definir que irá incidir sobre os seguintes temas:

Produção de tijolos de terra crua compactada – granolometria, argamassa, homogeneização, compactação
e acondicionamento.

Demonstração do processo construtivo de uma parede de alvenaria.

Preparação de argamassa de saibro e cal para revestimentos.

Pintura com tinta de terra.

A actividade deste atelier pode ser visionada no seguinte endereço de internet: http://centoecatorze.blogspot.pt

Setembro 2013 – Exposição Galeria Alvarez.

Entre 20 de Setembro e 1 de Novembro de 2013 irá decorrer na Galeria Alvarez da Avenida da Boavista, na Cidade do Porto uma exposiçãodo trabalho desenvolvido.

Para esta exposição pretende-se também convidar pessoas que se sintam estimuladas a utilizarem a terra e a cal. À semelhança de uma  workshop “laboratório experimental” realizada em 2012. O desenvolvimento do trabalho, ao longo dos 15 dias que durou esta iniciativa, pode ser visualizado no seguinte endereço de Internet:http://saibronaeira.wix.com/laboratorio

Outubro 2013 – Produção de terra crua compactada em Dine.

Entre 5 e 7 de Outubro o módulo móvel de compactação de terra crua desloca-se a Dine para aí produzir tijolos utilizando a cal e terra locais.

TEXTO JUSTIFICATIVO SOBRE A VIAGEM.

Os fornos de cal em Dine fizeram parte de um processo artesanal de produção de cal, hidráulica e para pintar, que funcionou até à década de 1960. Este sistema produtivo pré-industrial era composto por 7 fornos que funcionavam continuamente. A cal obtida era utilizada sobretudo nas  construções do nordeste transmontano. Naquele tempo era a única actividade económica que possibilitava às pessoas obterem dinheiro.

Regista-se aqui o relato de quem comprou os primeiros sapatos com os trabalhos que a produção de cal envolvia.

Os trabalhos preparatórios eram a extracção da pedra das jazidas situadas nas imediações dos fornos e a recolha da raiz de urze, matéria  combustível da cozedura. O enchimento dos fornos era feito através de camadas alternadas e pedra e de urze retalhadas em pequenos pedaços. A  cozedura, acompanhada em permanência, durava entre 2 a 3 dias. Na parte inferior do forno a cal era recolhida e imediatamente pesada para comercialização sendo a unidade de medida o alqueire. Da investigação desenvolvida desde 2004 em torno da terra crua compactada destacam-se os seguintes aspectos:

Após a construção de uma máquina de compactação por meio hidráulico, no Departamento de Engenharia Civil do Pólo de Guimarães da  Universidade do Minho foram realizados ensaios ao comportamento mecânico do tijolo como resistência à compressão e flexão. Em paredes foi testada a resistência à compressão dos tijolos. No tijolo foi analisada à absorção de água por capilaridade e por imersão. O estudo incidiu ainda  sobre considerações sobre o comportamento térmico do material. Concluiu-se que a dosagem com melhor performance era a que indicava 4% de  cimento na composição. O resultado deste trabalho foi apresentado num seminário e workshop sob o tema “Sustentabilidade e Marketing” em setembro de 2008, que mereceu do seu coordenador, Arq. Paulo Mendonça, o seguinte comentário:

“Cada vez mais a envolvente exterior do edifício aparece como um elemento chave no desempenho funcional dos edifícios e a construção em terra pode contribuir para este desempenho, sobretudo pela sua inércia térmica, além de ser um material natural e de origem local, contribuindo  para a sustentabilidade da construção. Nos dias de hoje, a nossa sociedade vê a terra crua como um material ligado à pobreza,  contudo as inovações mais recentes nesta área podem mudar esta desajustada percepção e preconceitos em relação à construção em terra uma  vez que dotam o material de uma excelente qualidade e nova aparência. As inovações neste tipo de construção consistem sobretudo no desenvolvimento de soluções de estabilização do solo que trazem melhorias significativas em termos de durabilidade, economia, sustentabilidade e estética à construção em terra.” Actualmente em conjunto com Henrique Richard e Carlos Lima trabalham-se os equipamentos que visam integrar uma unidade móvel de produção de tijolos em terra crua. Produzir este tijolo em obra é assim mais um aspecto importante no conjunto de vantagens que já apresenta. Destaca-se o uso directo de uma matéria-prima (saibro arenoso) abundante na natureza e o facto não necessitar de ser cozido. O seu endurecimento é feito através de um estágio de sete dias em ambiente com humidade controlada. Se for viável substituir o cimento por esta cal hidráulica natural na sua composição teremos um material desta natureza.

Imagem 1:

Imagem esquemática do funcionamento dos fornos de cal em Dine. Este painel está colocado junto aos fornos e integram uma visita guiada que a sua proprietária oferece aos visitantes. Fotografia obtida na aldeia da Dine, Parque Natural do Montesinho, por Renato Brito em Agosto 2012.

Imagem 2:

Boca de carga do forno de cal em Dine. Fotografia obtida na aldeia da Dine, Parque Natural do Montesinho, por Renato Brito em Novembro  2012.

Imagem 3:

Pedra calcária utilizada na produção de cal hidráulica. A cal obtém-se calcinando o calcário num intervalo de temperatura de 902 a 1152 o C. As pedreiras de calcário situam-se nas imediações dos fornos. Depois de extraída tem que ser britada até atingir a dimensão semelhante a sabonetes. Fotografia obtida na aldeia da Dine, Parque Natural do Montesinho, por Renato Brito em Novembro 2012.